Há quarenta anos, num 23 de Maio inesquecível, eu era recebido nesta casa pelo verbo candente de Ibrahim Nobre, tribuno de 32, porta-voz dos anseios da Pátria Paulista.
Quatro décadas são passadas no convívio com as tradições e sonhos das quarenta cadeiras que ocupam o plenário deste sodalício.
Minha Academia que se faz tão linda,
Toda debruçada sobre seu passado,
Chácara do Arouche, chá que se transforma
Num ritual antigo, suave convivência.
Ronda de lembranças envolvendo a bênção
Dos cabelos brancos recordando sagas,
Canto que se encanta na canção do tempo,
Minha Academia tão paulista e linda!
Passam gerações e vão chegando os outros,
Conduzindo a senha de seus livros-sonhos,
Nas cadeiras-barcos vamos navegando
Entre as ilhas verdes das sessões de outrora.
Chegam peregrinos, partem navegantes,
Mas o fogo que arde na paixão das tochas
Vai de livro em livro iluminando rumos,
Ramos de saudade, ronda de lembranças
Perfumando estantes, percorrendo as salas;
Minha Academia de cabelos brancos
Toda debruçada sobre seu passado,
Numes tutelares que nos acompanham
Numa convivência que transpõe fronteiras,
Entre o agora e o sempre desses universos
Paralelos feitos de uma eterna idade.
Minha Academia de quarenta histórias,
De quarenta cantos de Piratininga,
Nas sessões futuras, quando eu for ausência,
Guarda-me no encanto deste chão do Arouche!
A vida de José Renato Nalini é toda ela uma lição de Ética. Vive com sabedoria a vocação judicante que se reflete naquilo que escreve e nos ensinamentos que transmite a seus alunos.
Mestre em Direito e doutor em convivência, magistrado culto e humano cujo exemplo nos transporta aos varões de Plutarco da Magistratura bandeirante.
A presença do novo acadêmico enriquece a história deste templo de cultura.
Ocupa a Cadeira número 40, de nobres tradições de erudição e civismo, patroneada por José Bonifácio moldador da nacionalidade, tão bem representado nesta Academia por sua descendente a Acadêmica Anna Maria Martins e, no passado, pela figura sempre lembrada de Raul de Andrada e Silva.
José Feliciano de Oliveira, o artífice dessa cadeira predestinada, nasce na Jundiaí fundada por seu ancestral Rafael de Oliveira, cidade que também seria berço de José Renato Nalini.
Feliciano, personalidade interessantíssima de astrônomo e literato, assestou o telescópio no planalto de Piratininga, indagando dos astros e voltando o campo de visão para a França da Belle Époque.
Em seguida, chega ao Largo do Arouche a personalidade apaixonante e apaixonada do caleidoscópico Menotti del Picchia; o homem que era o universo sondado pelas lentes inquietas de seu predecessor.
Poeta e romancista, teatrólogo e cineasta, jornalista e escultor, político e pintor, condestável da Semana de Arte Moderna que poderia hoje bradar na Praça Ramos de Azevedo:
- Brasileiros, do alto do Teatro Municipal de São Paulo, oito décadas de modernismo vos contemplam!
Quando o cantor de "Juca Mulato" nos deixou, apenas pude pronunciar em meu adeus:
- Entre todos os personagens que criou, o mais fascinante foi ele próprio.
A ele não podemos dizer: - descanse em paz e sim, prossiga sempre!
Na noite de hoje, Itapira dá boas vindas a Jundiaí!
Sucedendo ao poeta de Máscaras, nesta genealogia de talentos que se revezam, tive a emoção de saudar Duílio Crispim Farina, o sábio companheiro que trouxe da Medicina para a História o olhar clínico diagnosticando grandezas da tradição paulista.
Poucos amaram com tanta intensidade e com tamanho conhecimento a alma de uma terra e a memória de um povo!
Ontem, chorávamos a perda desse irmão mais velho, hoje, é a alegria quem recebe o irmão mais moço que aqui chega rodeado do respeito de seus pares, da admiração dos alunos, da empatia dos leitores, do carinho dos amigos.
Votuporanga, Itu, Barretos, Monte Azul Paulista e Jundiaí formam a ciranda de comarcas que evocam a lembrança do jovem magistrado que as percorreu.
Na década de oitenta, assessora com o brilho de sua inteligência a Corregedoria Geral e a Presidência do Tribunal de Justiça. Participa da criação da Escola Paulista da Magistratura e escreve a saga do Palácio da Justiça.
O autor de Constituição e Estado Democrático, Ética e justiça, O juiz e o Acesso à Justiça, Ética Ambiental e outros livros que vão do Recrutamento e Preparo de Magistrados à atualização de obras clássicas de José Frederico Marques, lançará brevemente A Rebelião da Toga.
Longa é a peregrinação do novo acadêmico pelos caminhos da rosa dos ventos. Participa em Washington, Venezuela, Portugal, França, Bélgica, Itália, Espanha, Japão e Alemanha de cursos e seminários sobre Escolas de Magistraturas, a Reforma Judicial e "O papel do juiz no processo de integração regional".
Os rumos que percorre lecionando Ética e Direito Constitucional, Instituições Judiciárias e Filosofia do Direito, Processo Penal e Ética Jurídica vão formando o mosaico que retrata alguém que vivencia com rara sensibilidade as Perspectivas do Juiz e do Judiciário no limiar do Século XXI.
Nalini por sua formação religiosa traz do passado uma postura templária e franciscana, de alguém que vive entre o combate, a meditação e o amor ao próximo.
Ao mesmo tempo é o pensador moderno e atualizado na dramaturgia dos grandes problemas do homem contemporâneo.
Mas, do elmo de cavaleiro medieval e da participação intensa nos desafios da hora presente, surge, completando o tríptico dessa personalidade rara, o contemporâneo do futuro. O pensador que se projeta além de seu tempo na vocação de abrir caminhos e de marcar encontro consigo mesmo numa esquina do universo onde o horizonte se detém para receber aquele que ousou sonhá-lo.
No ano em que Vossa Excelência assume a Presidência do Tribunal de Alçada Criminal, comemoramos também a chegada de sua mocidade ao cenáculo de nossos cabelos brancos.
Sob a bênção de sua Mãe, Dona Benedita, sob o aplauso de seus pares e o entusiasmo da platéia de amigos, na condição de decano desta família de quarenta irmãos, dou as boas-vindas da Academia Paulista de Letras ao Acadêmico José Renato Nalini.