Jovens colegas que ainda crêem no milagre da Poesia.
Há exatamente sessenta anos, entregava a Guilherme de Almeida e a Tarsila do Amaral os originais de meu primeiro livro “Antonio Triste” que sairia dois anos mais tarde.
Há sessenta anos Annita Malfatti retratava minha inquieta juventude no momento em que eu publicava no Correio Paulistano meu primeiro artigo.
Tudo lembrado ainda há pouco por Maria Adelaide Amaral e Alcides Nogueira na minissérie da Globo “Um Só Coração” que quando terminou, pedi a seus autores que nela me conservassem para sempre e que não me deixassem sair mais daquele São Paulo dos anos 40, daquela Paulicéia de meus 20 anos!
No entanto, vejo que foi bom ter saído de “Um Só Coração” para ver que a poesia prossegue vivendo no coração dos jovens que sonham poesia, vivem poesia e escrevem poesia.
O 1º Concurso Jovem Poeta é um prêmio para Paulo Bomfim.
Ter o nome ligado eternamente aos premiados desta noite e de outras noites que virão é transfusão espiritual de juventude que recebo gratificado em minhas quase oito décadas de vida.
Em 23 de Maio de 1963, neste auditório, em meu discurso de posse na Academia Paulista de Letras, disse:
Creio na força do verbo,
Nos destinos da palavra,
Espada escrita e falada
Servindo nas grandes causas.
Creio no ideal da cultura,
Na beleza imperecível
Que transforma a argila em luz.
Dezoito anos mais tarde, neste mesmo local, ao receber o Troféu “Juca Pato” de Intelectual do Ano afirmei:
Todos aqui reunidos sabem, na própria carne, que escrever é andar de veias abertas dando de si aos que têm fome de justiça e de beleza.
O intelectual é antes de tudo um forte.
Faz de suas fraquezas a força da mensagem. Molda verdades imorredouras, e da dança das palavras cria a perspectiva do porvir. Fala por muita gente, dá voz a muito silêncio e vida a uma realidade que deve ser transformada.
O ritmo é a respiração do pensamento, e a alma não cabe na memória dos computadores e nem se enquadra no paraíso do consumo. O mistério do ser escapa às tecnocracias.
A literatura é o universo paralelo da vida. Em certos casos, mais criativa do que ela. O personagem é a antimatéria do leitor.
Vida e literatura comunicam-se através de túneis de palavras.
Em ambas tenho encontrado seres fascinantes. A arte é uma lição permanente oferecida ao homem que passa apressado.
Encerrando minha oração fiz então minha profissão de fé que confirmo hoje passando a tocha de ontem aos poetas que me sucedem nesta noite:
Sou feito de várias raças e de várias condições sociais. Em todo canto há um pouco de meu lar e em todos um pouco de mim.
Procuro ser livre, mas num mundo de prisioneiros a liberdade acaba sempre ferindo os companheiros de cela.
Só amando nos renovamos. O êxtase é a única linguagem comum a todo o infinito. É o alimento do efêmero e do eterno. Através do amor o humano se diviniza e o divino se humaniza.
Procuro renascer todos os dias. Não concordo em morrer vivo. Sou um rebelde de paletó e gravata, um grão que teima em não virar massa, um pássaro que persiste no canto, dentro da gaiola dos horários. Gosto de morar em pessoas, de falar dialetos de ternura e de dar asas a tudo que me cerca. Creio na alquimia de certos encontros e que a eternidade é uma questão de garra ou de graça.
Através de livros deixamos o casulo e passamos a voar com as próprias asas.
Neste momento de tanta angústia o livro torna-se a tábua possível de resistir ao naufrágio e comandar marés. Cabe a ele a missão de povoar solidões.
Às vezes escrevemos o poema, outras, somos por ele escritos. O certo é impregnar dimensões com a vibração que irá alimentar a anemia espiritual das gerações vindouras.
Por outro lado alguém também escreve com nossas vivências porque somos vocábulos na literatura dos deuses.
Sim, o escritor é antes de tudo um forte!
Conviva do inconformismo e caminheiro da circunstância, transforma vida em palavra e a palavra em vida.
Na gesta cotidiana arma-se cavaleiro na defesa dos oprimidos, na saga do dia a dia escreve com seu sangue o protesto nos muros cerceadores do ser.
É o grande perplexo a causar perplexidade em seu processo de criação e recriação do universo existencial.
Hoje, mais do que nunca, o poeta é uma figura incômoda, porque é ao mesmo tempo consciência mística do passado e habitante do futuro. Traz uma centelha do fogo que o gelo procura apagar.
Platão sabia que os poetas sempre foram e sempre serão expulsos de todas as repúblicas, porque onde eles estão as águas se agitam impedindo os tiranos de contemplar os próprios rostos.
Sim, amo tanto a liberdade que gostaria de ter filhos com ela!
Meu caro Secretário Gabriel Chalita que transmite aos destinos da Secretaria da Educação o calor de seu ideal, as luzes de sua cultura e a paixão de seu gesto semeador.
Jovens colegas, irmãos em Poesia,
De seus poemas premiados faço o meu poema de agradecimento:
“A Fome”, Viny César Pereira, desenha nossa bandeira de inconformismo,
O “Encontro”, Ariane Fadel, é porto de nossas metas,
“A Morte da Jacutinga”, Eder Antonio Branquinho Dias, é vôo unindo as duas margens da vida,
A “Cruz de Ferro”, Vanessa Ferreira Durão Sarti, abençoa a alma dos caminhos,
E o “Mar Azul”, Silvana da Silva Hartzer Vieira, traz na crista de suas ondas, a infância, praia perdida.
“Escutem” diz Michele Aparecida Bertanha, sempre é tempo de ternura,
“A Melhor Idade”, Maisa Barcelos de Lima, é a idade de ser poeta.
E “Nordestino”, Aristênio Fábio Lima Maia, constrói futuros com sua saudade,
A vida às vezes, Rodrigo de Oliveira Arruda, é um “Poema de Engarrafamento”,
Mas afinal, “Tudo é Brincadeira”, Andressa Carla de Abreu, lúdica peripécia, travessura e travessia que nos irmana para sempre na cumplicidade do mesmo sonho.
Paulo Bomfim