Minha infância foi alimentada pelo clima intelectual da casa de meus avós. Cresci rodeado de poesia e música nos saraus daquela vivenda aportada na rua Rego Freitas.

Quando penso que cheguei a conhecer Alberto de Oliveira, Martins Fontes e Catulo da Paixão Cearense, convivendo na remota meninice com Guilherme de Almeida e Mário de Andrade, sinto-me privilegiado.

Lembro nitidamente de Guilherme de Almeida em 1932 cantando numa reunião da Rego Freitas, a Canção do Soldado Paulista que acabara de fazer em parceria com Marcelo Tupinambá. A partir daí, o autor de Messidor seria pela vida afora o amigo e o mestre de minha inquieta mocidade.

Quanto a Mário de Andrade era figura obrigatória nas reuniões em casa de meus avós. Sentava-se ao piano e cantava a Viola Quebrada e modinhas imperiais que ia redescobrindo.

Minha convivência com Cassiano Ricardo principiou em 1945 quando ambos fazíamos temporada em Águas da Prata. Nessa época o poeta de Martins Cererê acabara de descobrir Fernando Pessoa cuja influência o faria escrever “Um dia depois do outro” que julgo ser um de seus melhores livros. É dessa época também a amizade com Menotti del Piccia e sua mulher a pianista Antonieta Rudge. Casal fascinante que reunia em sua residência da Avenida Brasil amigos e admiradores. Noites inesquecíveis onde mergulhávamos numa atmosfera de arte e inquietação.

Menotti figura saída de um painel modernista, romancista, poeta, pintor, musicista e jornalista cuja a pena inflamou a Semana de Arte Moderna. Antonieta que formava ao lado de Guiomar Novaes e Magdalena Tagliaferro o tríptico das maiores pianistas brasileiras.

As lembranças vão surgindo aos borbotões; mergulho nelas e sinto que são a circunstância que me explica.